Numa fria madrugada de novembro,
Estevan se encontra em uma estrada no meio do nada, debaixo de chuva, esperando
algum ser vivo passar e lhe oferecer carona. Ele andou por horas, esperou muito
e finalmente um caminhão para e o motorista, um homem de quase 60 anos, lhe
pergunta se ele quer carona. Estevan aceita e ao ser questionado sobre seu
destino, responde que não possui um e que está indo para onde o caminhão for.
Então, entra no caminhão, que segue seu caminho sem modificações.
Durante o percurso, Carlos, o
motorista, faz muitas perguntas sobre Estevan; sua vida e o por quê de estar
aquela hora naquele lugar. Estevan era o tipo de pessoa que não gostava de
falar de suas experiências e principalmente, odiava dar explicações de algo a
alguém. E enquanto inventava mentiras sobre si mesmo, ele se lembrava de seu
sujo passado, do qual queria fugir por um instante. Era muita história, muitos
interessados em ouvi-la mas nenhum interessado em contá-la.
A viagem era longa. Carlos só parou a 130 km dali, em uma cidade
pequena, mas movimentada. Parecia estar acontecendo algum tipo de exposição.
Era um leilão, onde as pessoas tentavam arrematar quadros de um artista
desconhecido mas que realmente eram muito bem feitos. Algo passou pela cabeça
de Estevan; a época em que pintava quadros e que se sentia muito bem fazendo
isso. Porém, seus quadros foram considerados assustadores e às vezes obscenos e
não cabiam na proposta da escola onde ele estudava arte, portanto, foi expulso.
Tendo seus sonhos de ser um grande artista praticamente destruídos, ele
resolveu fazer arte de uma outra forma...
Estevan voltou para a realidade sendo
chamado por Carlos. Os dois então voltaram para o caminhão e retomaram a
viagem.
Pararam novamente quase 2 horas
depois. Dessa vez, em um posto de gasolina. Eles foram até a loja de
conveniências e enquanto pediam algo para comer e beber, começaram a prestar
atenção no noticiário que passava em
uma TV pequena. A notícia do momento era assombrosa; um homem
havia sido morto há mais de 400
km dali, em sua casa, com 21 facadas. As facas estavam
ainda no corpo do cadáver que estava de costas sobre seu próprio sangue que já
estava seco. Ao retirar o corpo do homem do chão, a polícia se deparou com um
estranho desenho que parecia ser uma águia, feita caprichosamente com sangue e
algo fino, provavelmente a ponta de uma das facas.
Ao ouvir essa notícia, Estevan deu um
sorriso disfarçadamente e se lembrou que essa morte fazia parte de seu passado
sujo. E ele pensou em como era competente em cada assassinato que cometia. Até
hoje, havia matado 99 pessoas. Nunca tinha sido preso ou descoberto. Queria chegar
ao número de 100 assassinatos. Um número que não tinha significado. Ele apenas
tinha surgido em sua mente, enquanto executava sua 1ª vítima, cortando-a
demoradamente com cacos de vidro.
Novamente, Estevan voltou de suas
memórias por causa de Carlos, que horrorizado, comentava o que se passava no
noticiário. Estevan concordou com o que ele dizia, sem ouvi-lo direito e os
dois saíram da loja para retornar ao caminhão.
Estevan começou a imaginar como seria
seu próximo "trabalho". Ele pensou que poderia ser Carlos; ninguém
sentiria sua falta e o caminhão poderia lhe ser útil. Mas parecia ser fácil
demais. Estevan queria algo marcante. Pensou em todos os desenhos feitos com o
sangue de suas vítimas, em como elas foram mortas e percebeu que nenhuma dessas
mortes tinha sido "especial". Dessa vez, ele queria alguém difícil de
matar e queria um desenho que confundisse as pessoas. Ficou pensando até
adormecer, mas foi acordado poucos minutos depois por uma freada brusca do
caminhão. Era só um buraco. Como já era quase noite, Carlos parou o caminhão no
posto mais próximo e fechou os olhos. Estevan desceu do caminhão e caminhou em
direção a mata que rodeava o posto. Andou muitos metros e ouviu um barulho de
passos atrás dele. Gritou "Carlos" mas ouviu uma voz bem diferente da
dele.
_ Olá. - Estevan se voltou para trás e viu à sua
frente uma ruiva belíssima com uma arma na mão.
_ Quem é você. - ele perguntou.
_ Eu sou o fim de sua vida, aquela que veio se
vingar de um de seus crimes. A Ceifadora, se preferir. - a ruiva responde.
_ Do que está falando?
_ Você pode até pensar que é o melhor assassino do
mundo, mas está enganado. Não tomou cuidado o suficiente para que não fosse
descoberto. Eu vi quando você matou minha irmã. Desde então, tenho te seguido.
Estevan começou a ficar com raiva de
si mesmo. Aquela mulher demonstrava total segurança no que dizia e no que
queria fazer.
_ Quem é sua irmã? - perguntou ele.
_ Ela foi aquela que você matou sem nenhuma piedade
num parque ao cair da noite. Ela estava caminhando enquanto me esperava. Quando
cheguei, vi você levando ela para dentro da mata, um lugar como este. Fui atrás
cuidadosamente mas já era tarde. Agora, você vai morrer como ela, com 6 tiros e
um toque final.
_ Tente. - disse Estevan correndo para o lado e depois
indo para trás para confundir aquela mulher. Subiu em uma árvore alta e se
lembrou com detalhes do momento em que atirou em sua vítima, entre tantas
árvores, inclusive a que Estevan escolheu para deixar sua marca. Ela ainda
estava viva quando ele molhou os dedos com o sangue de suas feridas e desenhou
um ceifador na árvore em frente a ela, logo depois, ela fechou seus olhos pela
última vez. Quando pensou novamente no último olhar da moça, teve seus próprios
olhos fechados. A ruiva havia acertado um tiro em sua cabeça e, ao cair no
chão, disparou mais 5 tiros. E como ela mesma disse, deu um toque final; antes
que todo o sangue escorresse, usou uma bala que estava em seu bolso como pincel
e com o sangue de Estevan, ao invés de desenhar, expressou sua raiva em
palavras: 'Fim de jogo. O "artista" está morto e não irá mais
incomodar.' Depois saiu andando tranquilamente sem olhar para trás.