Uma velha história de amor e loucura, que conto para
relembrá-la. Não que fosse preciso porque é inesquecível. Ela desejava um
destino tão impossível e eu fingia concordar com tudo para que ela sorrisse. E
era o sorriso mais belo do mundo. Gostava de sua presença, do modo de ver o
mundo, de uma forma às vezes até doente que podia fazer seus ouvidos sangrarem
ao ouvir sua opinião. O que ela desejava são coisas que nunca vão acontecer
pois seriam necessárias mais pessoas como ela, o que mais uma vez, é
impossível. Todas as palavras ditas por aqueles lábios nunca serão ditos por
nenhum outro ser, nem podem ser descritas por mim. É algo realmente inefável.
Sua hipnotizante beleza também não podia ser reproduzida nem por fotografia,
ela era quase irreal. Bastante singular, também era quieta e nunca a vi
conversar por mais de 1 minuto com ninguém além de mim. Era como se eu fosse
especial. Como se eu fosse sua tradutora. Pena que até hoje não descobri sua
língua.
Um dia, tomada pela fúria, ela surgiu a minha frente
com uma camisola de cetim vermelho. Poderia ser a mais bela aparição. Eu estava
deitada na grama de um imenso jardim, cultivado no fundo de minha casa,
observando as estrelas quando a ouvi dizer “Acabe com a minha vida.” Após
observar aquela linda obra de arte que falava comigo, notei que ela segurava um
revólver. Não sei dizer se me assustei ou não. O brilho em seu olhar era tão
parecido ao céu que acabava de olhar. Demorou uns minutos para eu perceber o
que estava acontecendo. Talvez porque ela sempre me fazia pensar que estivesse
em um sonho. Acho que ela se assustou por mim, pois disse “Não me ouviu? Acabe
com a minha vida.” Me levantei e a abracei. Ela começou a chorar. Não que eu
seja sádica, mas seu lamento era lindo. Ouso dizer que era perfeito. Consegui
sussurrar “Por quê?” e ela com dificuldade respondeu “Porque não posso fazer
isso. Acabei de descobrir que preciso de você para tudo, até para deixar de
existir. Se o fizer, irei em paz. Até feliz. Por favor, faça. Não suporto mais
essa inútil vida.” Quando ouvi isso, até meu insensível coração pareceu gritar
de dor. Ela era a minha deusa. Nunca amei nada nem ninguém mais que a ela. Foi
sufocante ouvir cada palavra pronunciada de maneira tão dolorosa. O pior é que
eu sabia o motivo de seu sofrimento. Eu também o sentia. Entretanto, ela não
sabia ser cínica, não escondia sua revolta ao ver que ela era única. Sim, até
ela sabia disso. Para ela, ser diferente era angustiante. O que é compreensível
para alguém que nunca será compreendido. O que acontecerá comigo. Serei julgada
eternamente da pior forma. Nunca serei perdoada. Mas não é pelo perdão que
espero. É somente uma noite sem insônia que quero. Uma noite onde eu possa
sonhar com aquela encantadora mulher, vendo-a sorrir. Algo que não me lembre
aquela trágica noite em que me pedia para dizer adeus ao mais perfeito ser.
Pois se não tivesse me pedido isso, eu jamais atiraria em seu peito e nunca
teria de ver seu escarlate sangue se misturar ao cetim vermelho.