Eu amo seus olhos, o contorno suave da sua boca e o seu tom
de pele. Você fica deslumbrante com o cabelo solto. Sempre bela, encantadora e
simpática. Doce Marina. E eu, eu era apenas mais uma figurante no cenário em
que você atuava. Sempre tratada como algo que merece respeito apenas por
respirar. Eu sempre fiz as melhoras redações e matérias para o jornal da
faculdade mas, ninguém além do diretor e algum professor veio me parabenizar
por isso. Era sempre Marina e sua incrível vontade de ajudar todo mundo que
eram manchete principal. Você nunca fez nada além de seduzir pessoas, nada. E
eu sei que por baixo desse sorriso amável existe dor. Sim, eu sempre soube.
Você sempre tentou esconder a verdade; os pais desaparecidos no mar, os lares
para menores que você nunca pode chamar de abrigo, as pessoas que te traíram...
Sabe por quê eu sei? Porque quando somos esquecidos por culpa de alguém mesmo
que indiretamente, nos comparamos e após descobrir as diferenças, acabamos nos
moldando para ser como nosso inimigo. Afinal, só sendo a própria pessoa para
saber seu verdadeiro ponto fraco. Você pode fingir ser o que quiser para os
outros mas, sozinha, você é somente você. E eu me tornei você imitando as coisas
que já conhecia e investigando para descobrir algo novo. Você não me notou nem
quando estive ao seu lado; estava ocupada demais com os elogios, espelhos e máscaras.
Assim, eu passei a ser sua sombra e esqueci meu nome, esqueci meus sonhos, me
atraí pelo seu mundo fácil de sedução. Oh, que grande erro! Se houvesse somente
você, quem faria as partes importantes? Rapidamente soube o que tinha que
fazer.
Te sequestrei numa tarde tão bonita quanto seu rosto sem
esforços. Usando clorofórmio e a inteligência que você nunca teve, te coloquei
num carro e depois num caixão com uma câmera na tampa e ainda uma luz
improvisada para observar o show. Te enterrei e logo você acordou. Quase perdi
os primeiros momentos de susto e compreensão. Me sentei numa cadeira
confortável acima de você nesse quintal abandonado que nunca chamaria sua
preciosa atenção e através do meu celular eu assisti tudo. Primeiro a falta de
raciocínio lógico e negação “Onde estou? O que está acontecendo?”, depois a
incredulidade e sua voz com um tom desconhecido dizendo “isso não pode estar
acontecendo” e então desespero. Ah eu pude confirmar o quanto era doce enquanto
sussurrava preces com uma voz suave e ao mesmo tempo alterada. Quando gritava
você demonstrava quem era; frágil, sem nenhuma arma. Pois sua doçura não podia
te salvar agora; eu era você e a possuía. Da mesma forma, ninguém na faculdade
sentiria sua falta; eu era você e a substituiria. O jornal seria bem melhor sem
sua falsidade para competir com os fatos. E sua morte aparentemente sem sentido
seria a manchete que marcaria o início de uma nova fase para mim e, claro, para
nossos adoráveis colegas. É uma pena eu não poder divulgar para o mundo esse
vídeo que exibe a única coisa que você tinha de verdadeira: sua beleza. No fim,
nós duas saímos ganhando. Você perdeu sua dor e eu fiquei com o caminho livre
para encontrá-la um dia quando eu me lembrar que ela também é minha.